Promitente vendedor ou promissário comprador: quem responde pelas dívidas condominiais?
10/2021
Questão interessante foi pacificada pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1.345.331-RS, proferido nos moldes dos Recursos Repetitivos (TEMA 886), onde foi dirimida “controvérsia sobre quem tem legitimidade – vendedor ou adquirente – para responder por dívidas condominiais na hipótese de alienação da unidade, notadamente quando se tratar de compromisso de compra e venda não levado a registro” [1], estando o referido acórdão ementado nestes termos:
“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONDOMÍNIO. DESPESAS COMUNS. AÇÃO DE COBRANÇA. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO LEVADO A REGISTRO. LEGITIMIDADE PASSIVA. PROMITENTE VENDEDOR OU PROMISSÁRIO COMPRADOR. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. IMISSÃO NA POSSE. CIÊNCIA INEQUÍVOCA.
- Para efeitos do art. 543-C do CPC, firmam-se as seguintes teses: a) O que define a responsabilidade pelo pagamento das obrigações condominiais não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, representada pela imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação. b) Havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador, dependendo das circunstâncias de cada caso concreto. c) Se ficar comprovado: (i) que o promissário comprador se imitira na posse; e (ii) o condomínio teve ciência inequívoca da transação, afasta-se a legitimidade passiva do promitente vendedor para responder por despesas condominiais relativas a período em que a posse foi exercida pelo promissário comprador.
- No caso concreto, recurso especial não provido. (REsp 1345331/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/04/2015, DJe 20/04/2015)”.
De fato, tendo ocorrido a venda do imóvel através de compromisso particular ou escritura, não registrados, não se pode de modo expedito, responsabilizar a parte que consta como proprietário na matrícula do imóvel.
Isso porque, conforme decidido o que define a responsabilidade pelas obrigações de condomínio é a relação material com o imóvel, “representada pela imissão do promissário comprador na posse e pela ciência inequívoca do condomínio acerca da transação”.
Conforme consta do Informativo obtido no endereço eletrônico do C. STJ “(…) no caso de compromisso de compra e venda não levado a registro, dependendo das circunstâncias, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor quanto sobre o promissário comprador.”
Entretanto, se ficar comprovado que o promissário comprador se imitiu na posse e que o condomínio teve ciência inequívoca da transação, deve ser afastada a legitimidade passiva do promitente vendedor para responder por despesas condominiais relativas ao período em que a posse foi exercida pelo promissário comprador.
“O Código Civil de 2002, em seu artigo 1.345, regulou de forma expressa que o adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”, assinalou o ministro Luis Felipe Salomão, relator.
De acordo com o ministro, “as despesas condominiais, compreendidas como obrigações propter rem, são de responsabilidade daquele que detém a qualidade de proprietário da unidade imobiliária, ou ainda do titular de um dos aspectos da propriedade, tais como a posse, o gozo ou a fruição, desde que esse tenha estabelecido relação jurídica direta com o condomínio”.[2]
O art. 12 da Lei 4.591/64 estabelece que “Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio”.
E o art. 1.345 do Código Civil dispõe que “O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios”.
Ora, no caso, quem deve arcar com as despesas do condomínio é quem está usufruindo o bem.
O julgamento do REsp n.º 1.345.331-RS (RR, TEMA 886) possibilita um novo entendimento sobre a questão, que até então aceitava que o condomínio escolhesse a seu juízo, entre o proprietário ou compromissário comprador, quem teria melhores condições de cumprir com a obrigação, que posteriormente teria direito de regresso contra o verdadeiro responsável, tudo isso sem levar em conta a relação jurídica material com o imóvel, sendo representativo o seguinte julgado:
“1. CONDOMÍNIO. Despesas. Ação de cobrança. Legitimidade passiva. – A ação de cobrança de quotas condominiais pode ser proposta tanto contra o proprietário como contra o promissário comprador, pois o interesse prevalente é o da coletividade de receber os recursos para o pagamento de despesas indispensáveis e inadiáveis, podendo o credor escolher, – entre aqueles que tenham uma relação jurídica vinculada ao imóvel (proprietário, possuidor, promissário comprador, etc.), – o que mais prontamente poderá cumprir com a obrigação, ressalvado a este o direito regressivo contra quem entenda responsável” (REsp 223.282/SC)
Em sentido semelhante o seguinte acórdão: “As cotas condominiais, concebidas como obrigações propter rem, consubstanciam uma prestação, um dever proveniente da própria coisa, atribuído a quem detenha, ou venha a deter, a titularidade do correspondente direito real. Trata-se, pois, de obrigação imposta a quem ostente a qualidade de proprietário de bem ou possua a titularidade de um direito real sobre aquele. Por consectário, eventual alteração subjetiva desse direito, decorrente da alienação do imóvel impõe ao seu “novo” titular, imediata e automaticamente, a assunção da obrigação pelas cotas condominiais (as vincendas, mas também as vencidas, ressalta-se), independente de manifestação de vontade nesse sentido. Reconhecida, assim, a responsabilidade do “novo” adquirente ou titular de direito real sobre a coisa, este poderá, naturalmente, ser demandado em ação destinada a cobrar os correspondentes débitos, inclusive, os pretéritos, caso em que se preserva seu direito de regresso contra o vendedor (anterior proprietário ou titular de direito real sobre o imóvel)” (REsp 1440780 / RJ).
Após a fixação da tese dada pelo REsp n.º 1.345.331-RS (RR, TEMA 886), se o condomínio ajuizar ação de cobrança ou execução contra o proprietário que consta no título registral, mesmo tendo ciência inequívoca de que o bem foi compromissado à terceiro que se imitiu na posse e independente de registro no Cartório de Imóveis, caberá ao ex-proprietário vendedor arguir em defesa sua ilegitimidade passiva, produzindo as provas adequadas para tal fim, evitando com isso pagar por débitos que não deu causa, bem como ter que posteriormente ajuizar ação regressiva contra o devedor responsável.
Autor: Antonio Roberto Barrichello, advogado, engenheiro civil.
[1] Disponível em https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp
[2] Disponível em https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias-antigas/2015/2015-05-05_08-42_Relacao-material-com-imovel-define-responsabilidade-pelas-obrigacoes-de-condominio.aspx